terça-feira, 3 de janeiro de 2012

ALMAS À VENDA (2009), de SOPHIE BARTES - 30.12.2011

Neste filme Paul Giamatti vive ficcionalmente a sua própria vida, atormentada no momento por muitas problemas e questionamentos, e uma crise definitivamente se instala quando ele está ensaiando uma peça de Tchecov, "Tio Vânia", em que ele não consegue encontrar o tom para sua atuação, e o texto denso da peça parece lhe pesar demais, quando ele está confuso com sua vida, com sua profissão, seus vínculos afetivos.
Após ler um artigo na revista New Yorker, a pedido de seu agente, ele vai encaminhado a uma clínica de "armazenamento de almas", para que deixe sua alma guardada por um tempo para se livrar dessas angústias existenciais, desses sentimentos, para que fique mais leve sem seu íntimo.
Sua alma é extraída (e tem o formato de um grão-de-bico, o que frustra deveras o ator) e efetivamente ele se sente mais leve, não tem pensamentos negativos, não reage às mais diferentes emoções, passa a ser indiferente à sua mulher, sua atuação nos ensaios para a peça deixam de lhe ser pesarosos - e passam a ser em verdade uma brincadeira, pouco lhe importando os resultados, e sua atuação resulta cômica, risível, sem nenhum sentimento, pois toda sua densidade se foi.
Então, perdido em seus afetos, e na sua profissão, volta à clínica para recuperar sua alma, que, entretanto, sem se saber como, foi extraviada. O chefe médico da Soul Storage (o bom David Strathairn - Ed Murrow de Boa Noite, boa Sorte, um filmaço, diga-se) oferece uma alma substituta, enquanto a clínica tenta reaver a "verdadeira" alma de Paul. Ele, após relutar, aceita e com opções variadas, escolhe a alma de uma poeta russa, alma que embora não lhe substitua as emoções perdidas, lhe dá alguma sensibilidade, ele chega a dizer que se trata de uma grande alma esta que tomou emprestada, de uma grande pessoa. Com essa alma ele sente uma grande mudança, principalmente na sua interpretação na peça do autor russo, em que atua maravilhosamente. Mas ainda não desiste de reaver o seu próprio íntimo.
Antes já víramos uma cena em que - agora sabemos - uma mulher russa também tentara reaver sua alma, e esta mulher era exatamente a poetisa cuja alma foi "alugada" por Paul Giamatti, e que ao final, por não ter conseguido recuperar sua alma que vendera aos russos traficantes de almas, se suicida.
Mas cresce a curiosidade de Paul sobre o destino de sua alma, a origem da alma que lhe está emprestada, e de como se dá esse comércio de almas - ou tráfico, se preferirmos.
Nesse ponto, fica explicitada (já estava subentendida) a razão no filme da existência de uma Nina, uma mula que é usada para o contrabando de almas da Rússia para os Estados Unidos, e que nesse caso específico, levou (furtada) a alma de Paul Giamatti para a Rússia, sob encomenda da esposa do chefe do tráfico de almas (mas sem que a clínica soubesse desse furto), que deseja ser uma artista de sucesso, ainda que sem talento, só com beleza (em verdade, ela queria a alma de alguém mais famoso, como Al Pacino).
Em sua busca por sua alma, Paul consegue com o médico da Soul Storage informações sobre a mula e o tráfico de almas, e vai atrás de Nina, descobre o que houve, e ruma para a Rússia para reaver seu imo. 
A partir daqui filme perde muito de seu interesse. Em negociação com o traficante de almas, não obtém sucesso; depois, com o auxílio de Nina, furtivamente retira sua alma da pretendente a atriz e a recoloca em si mesmo (não sem antes ter de se reconectar com ela), para então voltar aos Estados Unidos, e ter de viver com "a dor e a delícia de ser o que é".
Quando volta para casa, a clínica Soul Storage sofreu uma intervenção governamental, as almas contrabandeadas foram compradas por uma empresa de gestão de ativos, e Paul, que pretendia devolver à Nina sua alma original (eis que ficou esvaziada para ser usada como mula de almas entre Rússia e EUA), não consegue tal intento por dois motivos: um, porque o preço da alma no mercado não é assim tão fácil de estimar, e Paul teria de pagar alto pelo que deseja; e, dois, principalmente porque Nina não poderia mais receber uma alma, por ter tantos resquícios (resíduos) de almas de outros que seu corpo não mais comportaria toda uma alma. 
O filme é muito mais interessante enquanto somente as questões íntimas de Giamatti (e por extensão, de qualquer um) são trazidas à tela, para alguma reflexão. Como lidarmos com os pesos que nos são inerentes, e se deixarmos de nos preocupar com tudo isso, ainda seremos nós mesmos? E cada um que passa por nossa vida, não deixa um resíduo de si? E o peso da vida de cada um, suas felicidades, suas dúvidas, suas agruras, não são exatamente aquilo que define cada ser humano? E que nossos sentimentos têm um preço, podem ser comprados e vendidos? Podem ser esquecidos? Sei lá se o filme é tudo isso, se apresenta tais questões realmente, mas gostei, achei divertido.
Nota IMDB: 6,5. Nota justa. Talvez um pouco mais.

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